segunda-feira, 28 de março de 2011

Pieter Brueghel, "O Velho"






Pieter Brueghel, conhecido como Pieter Brueghel, "O Velho" (para distinguí-lo de seu filho mais velho), foi o primeiro de uma família de pintores flamengos. Assinou como Brueghel até 1559 , depois seus filhos retiraram o "h" do sobrenome.

"O Velho", considerado um dos melhores pintores Flandres do século XVI, é o membro mais importante da família. Provavelmente nasceu em Breda, nos países baixos (popularmente conhecida como Holanda).

Foi admitido como mestre na Guilda de São Lucas com 26 anos, em 1551, e aprendiz de Coecke Van Aelst, artista de Antuérpia, escultor, arquiteto e "designer" de tapeçarias e vitrais. É nesta altura que Brueghel viaja para a Itália, onde produz uma série de pinturas, a maior parte das quais representando paisagens. Sua primeira obra assinada e datada foi produzida em Roma, em 1553.

Em 1553, se estabeleceu em Antuérpia e dez anos depois mudou para Bruxelas permanentemente. Casou-se com Mayken em 1563, filha de Van Aelst, seu mestre.

Por sua indiscritível personalidade, salienta-se Peter Brueghel, o Velho; também conhecido como Brugel, O camponês; para distingui-lo de outros membros da dinastia Brueghel. Desde 1559 ele largou o ‘h’ de seu nome e assinatura iniciou suas pinturas como Bruegel.

Viajou pela Itália para aprender a forma de pintar dos renascentistas permanecendo , como interno, uma temporada no atelier de um professor siciliano.

Foi um pintor de multidões e de cenas populares, com tal vitalidade que transborda do quadro. Além da sua predileção por paisagens, pintou quadros que realçavam o absurdo na vulgaridade, expondo as fraquezas e loucuras humanas, que lhe trouxeram muita fama. A mais óbvia influência sobre sua arte é de Hieronymus Bosch, em particular no início dos estudos de imagens demoníacas, como o "Triunfo da Morte" e "Dulle Griet". Foi na natureza, no entanto, que ele encontrou sea maior inspiração, sendo identificado como um mestre de paisagens. Ele é muitas vezes creditado como sendo o primeiro pintor ocidental a pintar paisagens para as suas próprias razões, e não como um pano de fundo histórico pintura.

Retratava a vida e costumes dos camponeses, sua terra, uma vívida descrição dos rituais da aldeia, da vida, incluindo agricultura, caça, refeições, festas, danças e jogos. Suas paisagens de inverno de 1565 (por exemplo "Caçadores na Neve") são tomados como provas corroborativas da gravidade dos invernos durante a Pequena Era Glacial.

Utilizando abundante espírito cômico e poder, criou algumas das primeiras imagens de protesto social na história da arte. Exemplos incluem pinturas como "A luta entre Carnaval e Quaresma" (uma sátira dos conflitos da Reforma).



-NO PALCO-

domingo, 27 de março de 2011

Alphonsus de Guimaraens

































-NO PALCO-
pulchra ut luna
ii

celeste... É assim, divina, que te chamas.
belo nome tu tens, dona celeste...
que outro terias entre humanas damas,
tu que embora na terra do céu vieste?

celeste... e como tu és do céu não amas:
forma imortal que o espírito reveste
de luz, não temes sol, não temes chamas,
porque és sol, porque és luar, sendo celeste.

incoercível como a melancolia,
andas em tudo: o sol no poente vasto
pede-te a mágoa do findar do dia.

e a lua, em meio à noite constelada,
pede-te o luar indefinido e casto
da tua palidez de hóstia sagrada.




Frances Farmer Will Have Her Revenge On Seattle




It's so relieving

To know that you're leaving
As soon as you getpaid
It's so relaxing
To hear that you're asking
Wherever you get yourway
It's so soothing
To know that you'll sue me
This is starting tosound the same

I miss the comfort in being sad
I miss the comfort in being sad
I miss the comfort in being sad

In her false witness
We hope you're still with us
To see if they float or drown
Our favorite patient
A display of patience
Disease-covered puget sound
She'll come back as fire
To burn all the liars
And leave ablanket of ash on the ground

I miss the confort in being sad
I miss the comfort in being sad
I miss the comfort in being sad

It's so relieving
To know that you're leaving
As soon as you getpaid
It's so relaxing
To hear that you're asking
Wherever you get yourway
It's so soothing
To know that you'll sue me
This is starting tosound the same

I miss the confort in being sad
I miss the comfort in being sad
I miss the comfort in being sad

-NO PALCO-

O MEU IMPOSSÍVEL

(Bouguereau-William-Les-Oreades-1902)


Minh’alma ardente é uma fogueira acesa,
É um brasido enorme a crepitar!
Ânsia de procurar sem encontrar
A chama onde queimar uma incerteza!

Tudo é vago e incompleto! E o que mais pesa
É nada ser perfeito.É deslumbrar
A noite tormentosa até cegar,
E tudo ser em vão! Deus, que tristeza!…

Aos meus irmãos na dor já disse tudo
E não me compreenderam!…Vão e mudo
Foi tudo o que entendi e o que pressinto…

Mas se eu pudesse a mágoa que em mim chora
Contar, não a chorava como agora,
Irmãos, não a sentia como a sinto!…


Florbela Espanca


-NO PALCO-

(A morte de Chatterton, 1856, por Henry Wallis)


Thomas Chatterton
(20 de Novembro 175224 de Agosto 1770) foi umpoeta britânico. Ficou conhecido pelas suas poesias escritas no estilo medieval e pelo fato de ter cometido suicídio com apenas 17 anos.

segunda-feira, 21 de março de 2011





Fim 
 Quando eu morrer batam em latas, Rompam aos saltos e aos pinotes, Façam estalar no ar chicotes, Chamem palhaços e acrobatas!  Que o meu caixão vá sobre um burro Ajaezado à andaluza... A um morto nada se recusa, Eu quero por força ir de burro.                         Mário de Sá Carneiro

O Pajem 
 Sozinho de brancura, eu vago --- Asa De rendas que entre cardos só flutua... --- Triste de Mim, que vim de Alma prà rua, E nunca a poderei deixar em casa...                        Mário de Sá-Carneiro

              Epígrafe  
   A sala do castelo é deserta e espelhada.   Tenho medo de Mim. Quem sou? De onde cheguei?... Aqui, tudo já foi... Em sombra estilizada, A cor morreu --- e até o ar é uma ruína... Vem de Outro tempo a luz que me ilumina --- Um som opaco me dilui em Rei...                        Mário de Sá-Carneiro

Álcool  
Guilhotinas, pelouros e castelos Resvalam longemente em procissão; Volteiam-me crepúsculos amarelos, Mordidos, doentios de roxidão.  Batem asas de auréola aos meus ouvidos, Grifam-me sons de cor e de perfumes, Ferem-me os olhos turbilhões de gumes, Descem-me a alma, sangram-me os sentidos.  Respiro-me no ar que ao longe vem, Da luz que me ilumina participo; Quero reunir-me, e todo me dissipo --- Luto, estrebucho... Em vão! Silvo pra além...  Corro em volta de mim sem me encontrar... Tudo oscila e se abate como espuma... Um disco de oiro surge a voltear... Fecho os meus olhos com pavor da bruma...  Que droga foi a que me inoculei? Ópio de inferno em vez de paraíso?... Que sortilégio a mim próprio lancei? Como é que em dor genial eu me eternizo?  Nem ópio nem morfina. O que me ardeu, Foi álcool mais raro e penetrante: É só de mim que ando delirante --- Manhã tão forte que me anoiteceu.                         Mário de Sá-Carneiro  

-NO PALCO-

segunda-feira, 14 de março de 2011


A poesia ganhou um dia específico, sendo este criado em homenagem ao poeta brasileiro Antônio Frederico de Castro Alves (1847-1871), no dia de seu nascimento, 14 de março.

Castro Alves ficou conhecido como o “poeta dos escravos”, pois lutou grandemente pela abolição da escravidão. Além disso, era um grande defensor do sistema republicano de governo, onde o povo elege seu presidente através do voto direto e secreto.

Sua indignação quanto ao preconceito racial ficou registrada na poesia “Navio Negreiro”, chegando a fazer um protesto contra a situação em que viviam os negros. Mas seu primeiro poema que retratava a escravidão foi “A Canção do Africano”, publicado em A Primavera.

Cursou direito na faculdade do Recife e teve grande participação na vida política da Faculdade, nas sociedades estudantis, onde desde cedo recebera calorosas saudações.

Castro Alves era um jovem bonito, esbelto, de pele clara, com uma voz marcante e forte. Sua beleza o fez conquistar a admiração dos homens, mas principalmente as paixões das mulheres, que puderam ser registrados em seus versos, considerados mais tarde como os poemas líricos mais lindos do Brasil.

Castro Alves
MOCIDADE E MORTE
Oh! Eu quero viver, beber perfumes
Na flor silvestre, que embalsama os ares;
Ver minh'alma adejar pelo infinito,
Qual branca vela n'amplidão dos mares.
No seio da mulher há tanto aroma...
Nos seus beijos de fogo há tanta vida...
— Árabe errante, vou dormir à tarde
À sombra fresca da palmeira erguida.

Mas uma voz responde-me sombria:
Terás o sono sob a lájea fria.

Morrer... quando este mundo é um paraíso,
E a alma um cisne de douradas plumas:
Não! o seio da amante é um lago virgem...
Quero boiar à tona das espumas.
Vem! formosa mulher — camélia pálida,
Que banharam de pranto as alvoradas.
Minh'alma é a borboleta, que espaneja
O pó das asas lúcidas, douradas...

E a mesma voz repete-me terrível,
Com gargalhar sarcástico: — impossível!
Eu sinto em mim o borbulhar do gênio.
Vejo além um futuro radiante:
Avante! — brada-me o talento n'alma

E o eco ao longe me repete — avante! —
o futuro... o futuro... no seu seio...
Entre louros e bênçãos dorme a glória!
Após — um nome do universo n'alma,
Um nome escrito no Panteon da história.

(...)

Morrer — é ver extinto dentre as névoas
O fanal, que nos guia na tormenta:
Condenado — escutar dobres de sino,
— Voz da morte, que a morte lhe lamenta —
Ai! morrer — é trocar astros por círios,
Leito macio por esquife imundo,
Trocar os beijos da mulher — no visco
Da larva errante no sepulcro fundo.

(...)

E eu morro, ó Deus! na aurora da existência,
Quando a sede e o desejo em nós palpita...
Levei aos lábios o dourado pomo,
Mordi no fruto podre do Asfaltita.
No triclínio da vida — novo Tântalo —
O vinho do viver ante mim passa...
Sou dos convivas da legenda Hebraica,
O 'stilete de Deus quebra-me a taça.

É que até minha sombra é inexorável,
Morrer! morrer! soluça-me implacável.

Adeus, pálida amante dos meus sonhos!
Adeus, vida! Adeus, glória! amor! anelos!
Escuta, minha irmã, cuidosa enxuga
Os prantos de meu pai nos teus cabelos.
Fora louco esperar! fria rajada
Sinto que do viver me extingue a lampa...
Resta-me agora por futuro — a terra,
Por glória — nada, por amor — a campa.

Adeus! arrasta-me uma voz sombria
Já me foge a razão na noite fria!...

Navio Negreiro

Castro Alves

I

'Stamos em pleno mar... Doudo no espaço
Brinca o luar — dourada borboleta;
E as vagas após ele correm... cansam
Como turba de infantes inquieta.

'Stamos em pleno mar... Do firmamento
Os astros saltam como espumas de ouro...
O mar em troca acende as ardentias,
— Constelações do líquido tesouro...

'Stamos em pleno mar... Dois infinitos
Ali se estreitam num abraço insano,
Azuis, dourados, plácidos, sublimes...
Qual dos dous é o céu? qual o oceano?...

'Stamos em pleno mar. . . Abrindo as velas
Ao quente arfar das virações marinhas,
Veleiro brigue corre à flor dos mares,
Como roçam na vaga as andorinhas...

Donde vem? onde vai? Das naus errantes
Quem sabe o rumo se é tão grande o espaço?
Neste saara os corcéis o pó levantam,
Galopam, voam, mas não deixam traço.

Bem feliz quem ali pode nest'hora
Sentir deste painel a majestade!
Embaixo — o mar em cima — o firmamento...
E no mar e no céu — a imensidade!

Oh! que doce harmonia traz-me a brisa!
Que música suave ao longe soa!
Meu Deus! como é sublime um canto ardente
Pelas vagas sem fim boiando à toa!

Homens do mar! ó rudes marinheiros,
Tostados pelo sol dos quatro mundos!
Crianças que a procela acalentara
No berço destes pélagos profundos!

Esperai! esperai! deixai que eu beba
Esta selvagem, livre poesia
Orquestra — é o mar, que ruge pela proa,
E o vento, que nas cordas assobia...
..........................................................

Por que foges assim, barco ligeiro?
Por que foges do pávido poeta?
Oh! quem me dera acompanhar-te a esteira
Que semelha no mar — doudo cometa!

Albatroz! Albatroz! águia do oceano,
Tu que dormes das nuvens entre as gazas,
Sacode as penas, Leviathan do espaço,
Albatroz! Albatroz! dá-me estas asas.

II


Que importa do nauta o berço,
Donde é filho, qual seu lar?
Ama a cadência do verso
Que lhe ensina o velho mar!
Cantai! que a morte é divina!
Resvala o brigue à bolina
Como golfinho veloz.
Presa ao mastro da mezena
Saudosa bandeira acena
As vagas que deixa após.

Do Espanhol as cantilenas
Requebradas de langor,
Lembram as moças morenas,
As andaluzas em flor!
Da Itália o filho indolente
Canta Veneza dormente,
— Terra de amor e traição,
Ou do golfo no regaço
Relembra os versos de Tasso,
Junto às lavas do vulcão!

O Inglês — marinheiro frio,
Que ao nascer no mar se achou,
(Porque a Inglaterra é um navio,
Que Deus na Mancha ancorou),
Rijo entoa pátrias glórias,
Lembrando, orgulhoso, histórias
De Nelson e de Aboukir.. .
O Francês — predestinado —
Canta os louros do passado
E os loureiros do porvir!

Os marinheiros Helenos,
Que a vaga jônia criou,
Belos piratas morenos
Do mar que Ulisses cortou,
Homens que Fídias talhara,
Vão cantando em noite clara
Versos que Homero gemeu ...
Nautas de todas as plagas,
Vós sabeis achar nas vagas
As melodias do céu! ...

III


Desce do espaço imenso, ó águia do oceano!
Desce mais ... inda mais... não pode olhar humano
Como o teu mergulhar no brigue voador!
Mas que vejo eu aí... Que quadro d'amarguras!
É canto funeral! ... Que tétricas figuras! ...
Que cena infame e vil... Meu Deus! Meu Deus! Que horror!

IV


Era um sonho dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...

Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!

E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais ...
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
E voam mais e mais...

Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!

No entanto o capitão manda a manobra,
E após fitando o céu que se desdobra,
Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
"Vibrai rijo o chicote, marinheiros!
Fazei-os mais dançar!..."

E ri-se a orquestra irônica, estridente. . .
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Qual um sonho dantesco as sombras voam!...
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
E ri-se Satanás!...

V


Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus!
Se é loucura... se é verdade
Tanto horror perante os céus?!
Ó mar, por que não apagas
Co'a esponja de tuas vagas
De teu manto este borrão?...
Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!

Quem são estes desgraçados
Que não encontram em vós
Mais que o rir calmo da turba
Que excita a fúria do algoz?
Quem são? Se a estrela se cala,
Se a vaga à pressa resvala
Como um cúmplice fugaz,
Perante a noite confusa...
Dize-o tu, severa Musa,
Musa libérrima, audaz!...

São os filhos do deserto,
Onde a terra esposa a luz.
Onde vive em campo aberto
A tribo dos homens nus...
São os guerreiros ousados
Que com os tigres mosqueados
Combatem na solidão.
Ontem simples, fortes, bravos.
Hoje míseros escravos,
Sem luz, sem ar, sem razão. . .

São mulheres desgraçadas,
Como Agar o foi também.
Que sedentas, alquebradas,
De longe... bem longe vêm...
Trazendo com tíbios passos,
Filhos e algemas nos braços,
N'alma — lágrimas e fel...
Como Agar sofrendo tanto,
Que nem o leite de pranto
Têm que dar para Ismael.

Lá nas areias infindas,
Das palmeiras no país,
Nasceram crianças lindas,
Viveram moças gentis...
Passa um dia a caravana,
Quando a virgem na cabana
Cisma da noite nos véus ...
... Adeus, ó choça do monte,
... Adeus, palmeiras da fonte!...
... Adeus, amores... adeus!...

Depois, o areal extenso...
Depois, o oceano de pó.
Depois no horizonte imenso
Desertos... desertos só...
E a fome, o cansaço, a sede...
Ai! quanto infeliz que cede,
E cai p'ra não mais s'erguer!...
Vaga um lugar na cadeia,
Mas o chacal sobre a areia
Acha um corpo que roer.

Ontem a Serra Leoa,
A guerra, a caça ao leão,
O sono dormido à toa
Sob as tendas d'amplidão!
Hoje... o porão negro, fundo,
Infecto, apertado, imundo,
Tendo a peste por jaguar...
E o sono sempre cortado
Pelo arranco de um finado,
E o baque de um corpo ao mar...

Ontem plena liberdade,
A vontade por poder...
Hoje... cúm'lo de maldade,
Nem são livres p'ra morrer. .
Prende-os a mesma corrente
— Férrea, lúgubre serpente —
Nas roscas da escravidão.
E assim zombando da morte,
Dança a lúgubre coorte
Ao som do açoute... Irrisão!...

Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus,
Se eu deliro... ou se é verdade
Tanto horror perante os céus?!...
Ó mar, por que não apagas
Co'a esponja de tuas vagas
Do teu manto este borrão?
Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão! ...

VI


Existe um povo que a bandeira empresta
P'ra cobrir tanta infâmia e cobardia!...
E deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto impuro de bacante fria!...
Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta,
Que impudente na gávea tripudia?
Silêncio. Musa... chora, e chora tanto
Que o pavilhão se lave no teu pranto! ...

Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra
E as promessas divinas da esperança...
Tu que, da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança
Antes te houvessem roto na batalha,
Que servires a um povo de mortalha!...

Fatalidade atroz que a mente esmaga!
Extingue nesta hora o brigue imundo
O trilho que Colombo abriu nas vagas,
Como um íris no pélago profundo!
Mas é infâmia demais! ... Da etérea plaga
Levantai-vos, heróis do Novo Mundo!
Andrada! arranca esse pendão dos ares!
Colombo! fecha a porta dos teus mares!

-NO PALCO-

POEMA
Meus olhos têm telescópios
espiando a rua,
espiando minha alma
longe de mim mil metros.
Mulheres vão e vêm nadando
em rios invisíveis.
Automóveis como peixes cegos
compõem minhas visões mecânicas.
Há vinte anos não digo a palavra
que sempre espero de mim.
Ficarei indefinidamente contemplando
meu retrato eu morto.
João Cabral de Melo Neto.


-NO PALCO-

VIVA A PÓESIA

Poema(s) da Cabra

João Cabral de Melo Neto


Nas margens do Mediterrâneo
não se vê um palmo de terra
que a terra tivesse esquecido
de fazer converter em pedra.

Nas margens do Mediterrâneo
Não se vê um palmo de pedra
que a pedra tivesse esquecido
de ocupar com sua fera.

Ali, onde nenhuma linha
pode lembrar, porque mais doce,
o que até chega a parecer
suave serra de uma foice,

não se vê um palmo de terra
por mais pedra ou fera que seja,
que a cabra não tenha ocupado
com sua planta fibrosa e negra.

1

A cabra é negra. Mas seu negro
não é o negro do ébano douto
(que é quase azul) ou o negro rico
do jacarandá (mais bem roxo).

O negro da cabra é o negro
do preto, do pobre, do pouco.
Negro da poeira, que é cinzento.
Negro da ferrugem, que é fosco.

Negro do feio, às vezes branco.
Ou o negro do pardo, que é pardo.
disso que não chega a ter cor
ou perdeu toda cor no gasto.

É o negro da segunda classe.
Do inferior (que é sempre opaco).
Disso que não pode ter cor
porque em negro sai mais barato.

2

Se o negro quer dizer noturno
o negro da cabra é solar.
Não é o da cabra o negro noite.
É o negro de sol. Luminar.

Será o negro do queimado
mais que o negro da escuridão.
Negra é do sol que acumulou.
É o negro mais bem do carvão.

Não é o negro do macabro.
Negro funeral. Nem do luto.
Tampouco é o negro do mistério,
de braços cruzados, eunuco.

É mesmo o negro do carvão.
O negro da hulha. Do coque.
Negro que pode haver na pólvora:
negro de vida, não de morte.

3

O negro da cabra é o negro
da natureza dela cabra.
Mesmo dessa que não é negra,
como a do Moxotó, que é clara.

O negro é o duro que há no fundo
da cabra. De seu natural.
Tal no fundo da terra há pedra,
no fundo da pedra, metal.

O negro é o duro que há no fundo
da natureza sem orvalho
que é a da cabra, esse animal
sem folhas, só raiz e talo,

que é a da cabra, esse animal
de alma-caroço, de alma córnea,
sem moelas, úmidos, lábios,
pão sem miolo, apenas côdea.

4

Quem já encontrou uma cabra
que tivesse ritmos domésticos?
O grosso derrame do porco,
da vaca, do sono e de tédio?

Quem encontrou cabra que fosse
animal de sociedade?
Tal o cão, o gato, o cavalo,
diletos do homem e da arte?

A cabra guarda todo o arisco,
rebelde, do animal selvagem,
viva demais que é para ser
animal dos de luxo ou pajem.

Viva demais para não ser,
quando colaboracionista,
o reduzido irredutível,
o inconformado conformista.

5

A cabra é o melhor instrumento
de verrumar a terra magra.
Por dentro da serra e da seca
não chega onde chega a cabra.

Se a serra é terra, a cabra é pedra.
Se a serra é pedra, é pedernal.
Sua boca é sempre mais dura
que a serra, não importa qual.

A cabra tem o dente frio,
a insolência do que mastiga.
Por isso o homem vive da cabra
mas sempre a vê como inimiga.

Por isso quem vive da cabra
e não é capaz do seu braço
desconfia sempre da cabra:
diz que tem parte com o Diabo.

6

Não é pelo vício da pedra,
por preferir a pedra à folha.
É que a cabra é expulsa do verde,
trancada do lado de fora.

A cabra é trancada por dentro.
Condenada à caatinga seca.
Liberta, no vasto sem nada,
proibida, na verdura estreita.

Leva no pescoço uma canga
que a impede de furar as cercas.
Leva os muros do próprio cárcere:
prisioneira e carcereira.

Liberdade de fome e sede
da ambulante prisioneira.
Não é que ela busque o difícil:
é que a sabem capaz de pedra.

7

A vida da cabra não deixa
lazer para ser fina ou lírica
(tal o urubu, que em doces linhas
voa à procura da carniça).

Vive a cabra contra a pendente,
sem os êxtases das decidas.
Viver para a cabra não é
re-ruminar-se introspectiva.

É, literalmente, cavar
a vida sob a superfície,
que a cabra, proibida de folhas,
tem de desentranhar raízes.

Eis porque é a cabra grosseira,
de mãos ásperas, realista.
Eis porque, mesmo ruminando,
não é jamais contemplativa.

8

O núcleo de cabra é visível
por debaixo de muitas coisas.
Com a natureza da cabra
outras aprendem sua crosta.

Um núcleo de cabra é visível
em certos atributos roucos
que têm as coisas obrigadas
a fazer de seu corpo couro.

A fazer de seu couro sola,
a armar-se em couraças, escamas:
como se dá com certas coisas
e muitas condições humanas.

Os jumentos são animais
que muito aprenderam com a cabra.
O nordestino, convivendo-a,
fez-se de sua mesma casta.

9

O núcleo de cabra é visível
debaixo do homem do Nordeste.
Da cabra lhe vem o escarpado
e o estofo nervudo que o enche.

Se adivinha o núcleo de cabra
no jeito de existir, Cardozo,
que reponta sob seu gesto
como esqueleto sob o corpo.

E é outra ossatura mais forte
que o esqueleto comum, de todos;
debaixo do próprio esqueleto,
no fundo centro de seus ossos.

A cabra deu ao nordestino
esse esqueleto mais de dentro:
o aço do osso, que resiste
quando o osso perde seu cimento.

*

O Mediterrâneo é mar clássico,
com águas de mármore azul.
Em nada me lembra das águas
sem marca do rio Pajeú.

As ondas do Mediterrâneo
estão no mármore traçadas.
Nos rios do Sertão, se existe,
a água corre despenteada.

As margens do Mediterrâneo
parecem deserto balcão.
Deserto, mas de terras nobres
não da piçarra do Sertão.

Mas não minto o Mediterrâneo
nem sua atmosfera maior
descrevendo-lhe as cabras negras
em termos da do Moxotó.


Texto extraído do livro "João Cabral de Melo Neto - Obra completa", Editora Nova Aguilar - Rio de Janeiro, 1994, pág. 254.

-NO PALCO-

quinta-feira, 10 de março de 2011

Poema Antipático para o Carnaval


gosto de de vez em quando

escrever um verso antipático

isso me faz sentir

sendo aquilo que não sou:

um cara prático

gosto de alguns versos ranzinzas

tipo aqueles

de mancha em prazeres

e de ser algo como um relâmpago

pela janela de uma festa...

são coisas como essas

que à poesia ainda resta...

então desculpa

se digo coisas

que o povo não gosta

é que eu continuo achando

esta cultura brasileira

uma bosta

e há tanta gente lerda

que dá vontade

de mandar à merda

não é que eu não te ame

ó inacreditável Brasil

mas este teu carnaval

que val

à puta que pariu

(Alessandro Reiffer)

-NO PALCO-

terça-feira, 8 de março de 2011

PENSAMENTO NO DIA 8 DE MARÇO (e mensagem as mulheres)

Embora eu acha machista esse dia, mas, venho então aproveitar, já que foi criado esse dia, e parabenizar as mulheres, que na verdade todo dia é dia de admirar e parabenizar tais criaturas, e é sempre bom lembrar que ainda somos uma sociedade machista, e o feminismo ainda se baseia muito no machismo, (mas não tendo o feminismo não há como se basear no feminismo não é verdade, mas então que se baseiem no machismo mas não se tornem feministas-machistas) de forma que acabam sendo o outro lado da mesma moeda, mas a humanidade é enleia a isso.

Todos decidem ser oposição e nunca equilibrarem-se, afinal as necessidades não são iguais? Então por que criar coisas que tornam-se inúteis, assemelhando-se a política e seus partidos aos milhares, onde as necessidades não são diferentes para membros de uma mesma espécie!

Mas seguindo adiante, é lamentável a sociedade ter banido a figura feminina até na divindade, ostentando apenas o masculino, onde a base seria unir os dois.

Quanto é belo a dádiva da geração, em sua fisiologia e em sua metafísica, o próprio universo havera de ter sido gerado em algum útero ancestral. E deixando as necessidades fisiológicas de lado,( coisa que a mídia impõe as mulheres em especial, como mercadorias, coisa que estamos fadados a concatenar com essa idéia até a dizimação de nossa espécie, e que é deixado como suporte para nações futuras... ‘’desculpem essa verdade é cômica’’, mas voltando, retirando todo esse enfadonho encalço), é com lisonja e prazer que ainda temos nossas mulheres com sua capacidade, integridade e destreza, que cuidam de nós e nutrem esperança de um mundo melhor, pois não há conforto maior que um abraço materno, um beijo apaixonado, um prazer em seu intimo, enfim uma mulher ao seu lado, a mulher que carregas como parceira é, ao mesmo tempo, tua mãe, tua filha, tua amiga, tua força, tua mulher... um viva as mulheres, criaturas que nos trazem paz e conforto, se a tua mulher não te traz isso; deixem de assistir novelas, jornalismo violento, eduquem seus filhos, aprendam a ler livros, promovam bem estar, eliminem seus egos, e lembre-se de que você não tem mais quinze anos, se fizer birra, agir impulsivamente ou chorar, não terá nada, trabalhe sobre si mesmo!

Um abraço fraternal a todas as mulheres que são uma só; mas nem toda mulher é igual!

Parabéns e força sempre!

PAZ E POESIA!


-NO PALCO-

8 DE MARÇO (poema publicado no cenário as mulheres)






Odes de Ricardo Reis
Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio
Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlacemos as mãos.)

Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,
Mais longe que os deuses.

Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer nao gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
E sem desassosegos grandes.

Sem amores, nem ódios, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
E sempre iria ter ao mar.

Amemo-nos tranquilamente, pensando que podiamos,
Se quise'ssemos, trocar beijos e abrac,os e carícias,
Mas que mais vale estarmos sentados ao pé um do outro
Ouvindo correr o rio e vendo-o.

Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as
No colo, e que o seu perfume suavize o momento -
Este momento em que sossegadamente nao cremos em nada,
Pagãos inocentes da decadência.

Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-as de mim depois
Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova,
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos
Nem fomos mais do que crianças.

E se antes do que eu levares o o'bolo ao barqueiro sombrio,
Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti.
Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim - à beira-rio,
Pagã triste e com flores no regaço.

-NO PALCO-

8 DE MARÇO (poema publicado no cenário as mulheres)

I

Vem, Noite antiquíssima e idêntica,
Noite Rainha nascida destronada,
Noite igual por dentro ao silêncio, Noite
Com as estrelas lentejoulas rápidas
No teu vestido franjado de Infinito.

Vem, vagamente,
Vem, levemente,
Vem sozinha, solene, com as mãos caídas
Ao teu lado, vem
E traz os montes longínquos para o pé das árvores próximas,
Funde num campo teu todos os campos que vejo,
Faze da montanha um bloco só do teu corpo,
Apaga-lhe todas as diferenças que de longe vejo,
Todas as estradas que a sobem,
Todas as várias árvores que a fazem verde-escuro ao longe.
Todas as casas brancas e com fumo entre as árvores,
E deixa só uma luz e outra luz e mais outra,
Na distância imprecisa e vagamente perturbadora,
Na distância subitamente impossível de percorrer.

Nossa Senhora
Das coisas impossíveis que procuramos em vão,
Dos sonhos que vêm ter conosco ao crepúsculo, à janela,
Dos propósitos que nos acariciam
Nos grandes terraços dos hotéis cosmopolitas
Ao som europeu das músicas e das vozes longe e perto,
E que doem por sabermos que nunca os realizaremos...
Vem, e embala-nos,
Vem e afaga-nos.
Beija-nos silenciosamente na fronte,
Tão levemente na fronte que não saibamos que nos beijam
Senão por uma diferença na alma.
E um vago soluço partindo melodiosamente
Do antiquíssimo de nós
Onde têm raiz todas essas árvores de maravilha
Cujos frutos são os sonhos que afagamos e amamos
Porque os sabemos fora de relação com o que há na vida.

Vem soleníssima,
Soleníssima e cheia
De uma oculta vontade de soluçar,
Talvez porque a alma é grande e a vida pequena,
E todos os gestos não saem do nosso corpo
E só alcançamos onde o nosso braço chega,
E só vemos até onde chega o nosso olhar.

Vem, dolorosa,
Mater-Dolorosa das Angústias dos Tímidos,
Turris-Eburnea das Tristezas dos Desprezados,
Mão fresca sobre a testa em febre dos humildes,
Sabor de água sobre os lábios secos dos Cansados.
Vem, lá do fundo
Do horizonte lívido,
Vem e arranca-me
Do solo de angústia e de inutilidade
Onde vicejo.
Apanha-me do meu solo, malmequer esquecido,
Folha a folha lê em mim não sei que sina
E desfolha-me para teu agrado,
Para teu agrado silencioso e fresco.
Uma folha de mim lança para o Norte,
Onde estão as cidades de Hoje que eu tanto amei;
Outra folha de mim lança para o Sul,
Onde estão os mares que os Navegadores abriram;
Outra folha minha atira ao Ocidente,
Onde arde ao rubro tudo o que talvez seja o Futuro,
Que eu sem conhecer adoro;
E a outra, as outras, o resto de mim
Atira ao Oriente,
Ao Oriente donde vem tudo, o dia e a fé,
Ao Oriente pomposo e fanático e quente,
Ao Oriente excessivo que eu nunca verei,
Ao Oriente budista, bramânico, sintoísta,
Ao Oriente que tudo o que nós não temos,
Que tudo o que nós não somos,
Ao Oriente onde — quem sabe? — Cristo talvez ainda hoje viva,
Onde Deus talvez exista realmente e mandando tudo...

Vem sobre os mares,
Sobre os mares maiores,
Sobre os mares sem horizontes precisos,
Vem e passa a mão pelo dorso da fera,
E acalma-o misteriosamente,
ó domadora hipnótica das coisas que se agitam muito!

Vem, cuidadosa,
Vem, maternal,
Pé ante pé enfermeira antiquíssima, que te sentaste
À cabeceira dos deuses das fés já perdidas,
E que viste nascer Jeová e Júpiter,
E sorriste porque tudo te é falso é inútil.

Vem, Noite silenciosa e extática,
Vem envolver na noite manto branco
O meu coração...
Serenamente como uma brisa na tarde leve,
Tranqüilamente com um gesto materno afagando.
Com as estrelas luzindo nas tuas mãos
E a lua máscara misteriosa sobre a tua face.
Todos os sons soam de outra maneira
Quando tu vens.
Quando tu entras baixam todas as vozes,
Ninguém te vê entrar.
Ninguém sabe quando entraste,
Senão de repente, vendo que tudo se recolhe,
Que tudo perde as arestas e as cores,
E que no alto céu ainda claramente azul
Já crescente nítido, ou círculo branco, ou mera luz nova que vem.

A lua começa a ser real.

Álvaro de Campos (Fernando Pessoa)

-NO PALCO-

segunda-feira, 7 de março de 2011




Ai de mim! Se neste intento,

e costume de pecar

a morte me embaraçar

o salvar-me, como intento?

que mau caminho freqüento

para tão estreita conta;

oh que pena, e oh que afronta

será, quando ouvir dizer:

vai, maldito, a padecer,

onde Lucifer te aponta.

Valha-me Deus, que será

desta minha triste vida,

que assim mal logro perdida,

onde, Senhor, parará?

que conta se me fará

lá no fim, onde se apura

o mal, que sempre em mim dura,

o bem, que nunca abracei,

os gozos, que desprezei,

por uma eterna amargura.

Que desculpa posso dar,

quando ao tremendo juízo

for levado de improviso,

e o demônio me acusar?

Como me hei de desculpar

sem remédio, e sem ventura,

se for para aonde dura

o tormento eternamente,

ao que morre impenitente

sem confissão, nem fé pura.

Nome tenho de cristão,

e vivo brutualmente,

comunico a tanta gente

sem ter, quem me dê a mão:

Deus me chama co perdão

por auxílios, e conselhos,

eu ponho-me de joelhos

e mostro-me arrependido;

mas como tudo é fingido,

não me valem aparelhos.

Sempre que vou confessar-me,

digo, que deixo o pecado;

porém torno ao mau estado,

em que é certo o condenar-me:

mas lá está quem há de dar-me

o pago do proceder:

pagarei num vivo arder

de tormentos repetidos

sacrilégios cometidos

contra quem me deu o ser.

Mas se tenho tempo agora,

e Deus me quer perdoar,

que lhe hei de mais esperar,

para quando? ou em qual hora?

que será, quando traidora

a morte me acometer,

e então lugar não tiver

de deixar a ocasião,

na extrema condenação

me hei de vir a subverter.

(Gregório de Matos)


-NO PALCO-

Quem não cuida de si, que é terra........................................erra

Que o alto Rei por afamado..................................................amado,

E quem lhe assiste ao desvelado .........................................lado

Da morte ao ar não desaferra................................................aferra.

Quem do mundo a mortal loucura..........................................cura,

A vontade de Deus sagrada..................................................agrada,

Firmar-lhe a vida em atadura.................................................dura.

Ó voz zelosa, que dobrada....................................................brada,

Já sei, que a flor da formosura...............................................usura

Será no fim desta jornada......................................................nada.


(GREGÓRIO DE MATOS)


-NO PALCO-



quarta-feira, 2 de março de 2011

The Song of the Hiawatha (1855)




Listless, careless Shawondasee!
In his life he had one shadow,
In his heart one sorrow had he.
Once, as he was gazing northward,
Far away upon a prairie
He beheld a maiden standing,
Saw a tall and slender maiden
All alone upon a prairie;
Brightest green were all her garments,
And her hair was like the sunshine.

Day by day he gazed upon her,
Day by day he sighed with passion,
Day by day his heart within him
Grew more hot with love and longing
For the maid with yellow tresses.
But he was too fat and lazy
To bestir himself and woo her.
Yes, too indolent and easy
To pursue her and persuade her;
So he only gazed upon her,
Only sat and sighed with passion
For the maiden of the prairie.

Till one morning, looking northward,
He beheld her yellow tresses
Changed and covered o'er with whiteness,
Covered as with whitest snow-flakes.
"Ah! my brother from the North-land,
From the kingdom of Wabasso,
From the land of the White Rabbit!
You have stolen the maiden from me,
You have laid your hand upon her,
You have wooed and won my maiden,
With your stories of the North-land!"

*TRADUÇÃO

O Canto de Hiawatha

Desatento, descuidado Shawondasee!
Na vida ele tinha uma sombra,
Em seu coração, uma tristeza tinha ele.
Certa vez, ao olhar para o norte,
Além de uma pradaria
Ele vislumbrou uma donzela,
Uma donzela alta e esbelta ele viu
Completamente só em uma pradaria;
O verde mais brilhante era sua única vestimenta,
E seu cabelo era como o brilho do sol.

Dia- após -dia ele a admirava,
Dia -após- dia ele suspirava de paixão,
Dia-após-dia seu coração em seu íntimo
Ficava mais acalorado de amor e espera
Pela dama de tranças amarelas.
Mas ele era muito gordo e preguiçoso
Para tomar uma atitude e cortejá-la.
Sim, muito indolente e folgado
Para procurá-la e persuadi-la;
Então ele apenas a fitava,
Apenas sentava e suspirava de paixão
Pela donzela da pradaria.

Até que numa manhã, olhando para o norte,
Ele vislumbrou as tranças amarelas
Diferentes e cobertas de brancura,
Recobertas como com os mais brancos flocos de neve.
"Ah, meu irmão da Terra do Norte,
Do Reino de Wabasso,
Da terra do Coelho Branco!
Você roubou a donzela de mim,
Você pôs as mãos sobre ela,
Você cortejou e conquistou a minha donzela,
Com suas histórias da Terra do Norte!"

- Henry Wadsworth Longfellow -

-NO PALCO-